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terça-feira, 10 de abril de 2012

"Wish You Were Here"

Igor Morais, vítima da tragédia em Realengo.
Imagem: G1.

"Como eu queria, como eu queria que você estivesse aqui. Somos apenas duas almas perdidas nadando em um aquário. Ano após ano, correndo sobre este mesmo velho chão, o que encontramos? Os mesmos velhos medos. Queria que você estivesse aqui."
~ "Wish You Were Here", Pink Floyd.

Já se passou um ano, e pergunto - quantos se lembraram? Não vou julgar quem esqueceu, afinal de contas, se não tivesse sido tão próximo de mim, talvez não tivesse lembrado.

Infelizmente, foi com uma tragédia que meu adorado-odiado bairro ficou conhecido, até mesmo internacionalmente. Antes, às vezes, lembrado na canção de Gilberto Gil - "Alô, alô, Realengo, aquele abraço!". Preferia que lembrassem só da canção.

Um ano depois, o que mudou? Precisou acontecer uma tragédia para que melhorassem a escola e até o ensino. Fizeram as mudanças para tentar enterrar o que houve. Que fizessem a mudança, mas não esquecessem. Deveria ser lembrado sempre, com carinho. "Quem semeia o mal, colhe tempestade." Nossos atos interferem no futuro. É uma lição que deveria ser aprendida.

Naquele dia, eu e meu avô estávamos indo para uma audiência. Passamos ao lado do policial que, meia hora depois, viraria herói. Estava tendo uma blitz na rua. No meio do caminho, minha avó nos ligou dizendo que estava tendo um tiroteio na Piraquara, que tinha criança ferida. Estava com medo de ter sido na escola da minha irmã. Não era. Depois do ocorrido, não se falava em mais outra coisa. Nunca vi tanta gente para falar de "Realengo" e "Piraquara", como se conhecessem.

Moro há 200 metros da escola onde tudo aconteceu. Filhos de vizinhos e conhecidos estudam lá. Conhecia o Igor de vista. Ele era um primo de consideração de um amigo. Já consigo olhar para a foto da minha avó sem meu olhos encherem d'água, mas não para a foto dele. Era bonitinho. Sempre me lembro de como ele se foi tão jovem, com tantos planos e sonhos (queria ser jogador de futebol), da maneira brutal como foi morto. De como ele e o irmão, Dudu, eram tão amigos... É estranho ver o Dudu sozinho, e sempre que o vejo não consigo não pensar no ocorrido. Na dor das famílias...

Antes da morte da minha avó, a perda do Igor foi a maior dor que eu já tinha sentido. Seu enterro foi o primeiro que fui. Se eu sofri tanto por alguém que só conhecia de vista, imagina os familiares. Agora sei que é uma dor indescritível.

Outro fator que me faz não esquecer é a probabilidade de eu ter estudado com o atirador, antes de ele ir para a Tasso, na 5ª série. Lembro que cheguei a estudar com alguns "Wellingtons". Sempre soube que seu rosto me era familiar. Só o conhecia de vista. Tenho quase certeza de que o tenho em uma da minhas fotos de passeio. Quero achá-la. E aí talvez solucione minha dúvida. Já meu amigo estudou com ele no Ensino Médio, também só o conhecia de vista. E quase estudei na mesma escola. Quase sempre passo em frente a casa onde morou.

Falam que ele era tímido, quieto. Que sofreu bullying. "Esquisito". Aí, temos algo em comum. Eu era tímida, quieta, sofri bullying (e ainda sofro às vezes), sempre me tachavam de "esquisita". Questiono: por que será que não fiquei como ele? Talvez porque eu queria encontrar pessoas que me aceitassem, em vez de me afastar completamente. Ou talvez se eu fosse homem, eu tivesse ficado mais parecido com ele. Mas eu nunca pensei em fazer mal a ninguém, mesmo a quem me fez mal. E nunca apoiei atos anarquistas ou terroristas, porque sempre quis tudo certo, dentro das normas. Isso é graças a educação rígida e traumatizante da minha avó, mas ela podia ter me transformado em um monstro.

A tragédia em Realengo me marcou tanto que virou um fantasma. Sei que é pior para aqueles que viveram e ainda vivem o terror. Não houve um único dia que não deixei de pensar, mesmo que por um minuto. E conforme foi se aproximando da data, entrei em contagem regressiva. Lembrar sempre mexe comigo, às vezes, fico com os olhos marejados. Mas até que é bom, para me fazer refletir.

"E todos terão refúgio nas leis. E ninguém mais matará crianças.
Noite após noite, rondando meu cérebro, seu sonho está enlouquecendo-me. E no canto de algum campo estrangeiro, o atirador dorme esta noite. O que está feito está feito. Não podemos simplesmente cancelar sua cena final. Presta atenção ao seu sonho. Presta atenção."
~ "The Gunner's Dream", Pink Floyd.

4 comentários:

  1. Eu não sabia que você morava tão perto de onde tudo aconteceu.
    Não tenho muito o que dizer, chorei lendo seu post.
    Mesmo estando longe eu também nunca vou esquece essa tragédia.

    Beijos da ♥ Amy | BLOG |

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  2. Me deu uma dor no coração ao ler este texto, não sabia que vc morava perto também. É tão triste isso.

    Beijos ♥

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  3. Realmente é complicado tocar no assunto, alguns alunos chamavam- o de monstro nas entrevistas, mas quanta vezes ele já não ouviu isso quando era mais novo?
    Não digo que sofri bullying, mas enfim, magra, alta, gostos diferentes, acho que só não me ferrava mais porque minha mãe dava aula na mesma escola que eu estudei quando mais nova... Lembro-me de uma vez que fingi dormir, para ver se o pessoal não me zuava... Mas, matar pessoas inocentes.. Realmente somente ele sabia o que sentia...
    E é triste também ligar um nome a uma tragédia. Eu digo que não é uma vida que se vai, são várias, são vários corações perfurados...

    Mas enfim, interessante o seu post, nessas horas a gente começa a parar para pensar que 'bullying' não é um assunto que já enjoou, enquanto ainda houver isso, ainda haverá a luta pela mudança.

    ~

    Sobre o Lolita e Alice, realmente a história mágica proporciona o uso do Lolita em vários personagens.
    E sobre os modelos, o 1º eu não achei tão estranho porque já vi uma amiga usando, e ficou bonito, mas o 10º mesmo ficou tenso, mas procurando, tinha cada um que me dava medo [Outras prints]....
    Cara, acho que os como o um Sweet Old School, como um OTT ficariam bem bacaninhas :3

    E é isso... Bye o/

    http://avidadealguemanormal.blogspot.com.br

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  4. É realmente triste e complicado. A vida é tão dura ao mesmo que tão frágil...

    Enfim, te favoritarei no meu blogroll.

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